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04/06/2016
Por: Equipe Fundo Dema
Assunto: Notícias
Leitura: 5 minutos

Violações de direitos são destacadas em debate sobre a construção de hidrelétricas no Tapajós

Por Élida Galvão

Fundo Dema

 

Atuando em defesa da Amazônia e dos povos que nela habitam, durante os dias 23 e 24 de maio, o Fundo Dema esteve representado no seminário “Impactos, desafios e perspectivas dos grandes projetos na Bacia do Tapajós”, realizado na cidade de Itaituba, região da BR 163, Oeste do Pará. O evento discutiu sobre o megaprojeto do Governo Federal intitulado ‘Complexo Hidrelétrico do Tapajós’. Planejado desde 2008, o projeto é voltado para a construção de 43 barragens de tamanhos variados na Bacia do Tapajós e seus afluentes Teles Pires, Juruena e Jamanxim.

Representantes de órgãos públicos, dos movimentos sociais, povos e comunidades tradicionais debateram de forma intensiva as ilegalidades e os impactos socioambientais do empreendimento que prioritariamente visa atender às expectativas capitalistas e está sendo planejando sem consulta pública aos moradores de Santarém, Belterra, Itaituba, Trairão, Novo Progresso, Aveiro, Juruti, Rurópolis e Jacareacanga, no Pará, e de Maués, no Amazonas, municípios que acolhem a Bacia do Tapajós.

Participantes debatem as inconstitucionalidades e violações de direitos ligadas à possível construção da barragem

Apoiando a realização do seminário promovido pelo Ministério Público Federal (MPF), o Fundo Dema esteve representado por Matheus Otterloo, presidente do Comitê Gestor, pelos dinamizadores, Jurandir Alves e Egídio Sampaio, ambos da comissão Pastoral da Terra (CPT) e da Prelazia de Itaituba, e Madalena Oliveira, do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Itaituba (STTR – Itaituba), entidade que integra o Comitê Gestor do Fundo Dema. “Este seminário criou um espaço para os movimentos sociais e a sociedade civil da região para tomar conhecimento dos planos na região, mas especialmente par tirar os movimentos sociais da invisibilidade, externando a violação de seus direitos já existentes e criar condições para barrar outras [hidrelétricas] e até maiores que se delineiam através dos grandes projetos na região”, avalia Matheus.

Mobilização

Mobilizando e garantindo a participação de 60 famílias de comunidades apoiadas pelo Fundo Dema – como as comunidades Baixão Bonito, Batata, Bom Jesus, localizadas em Trairão, e a comunidade Campo Verde, localizada em Itaituba –, os dinamizadores consideram importante a integração das pessoas com o assunto debatido, já que as comunidades possivelmente serão atingidas pelas barragens, caso o projeto seja concretizado.

Entre os participantes do seminário estava Rosângela Pereira, presidente da Associação dos Agricultores Familiares da Batata, no município de Trairão. Para a agricultora, o evento possibilitou a troca de experiências entre os projetos apoiados, que ainda puderam expor seus produtos e ajudou a esclarecer sobre as consequências negativas da possibilidade de se construir a Hidrelétrica de São Luiz do Tapajós. “Este é um seminário de grande importância porque, além de fortalecer a experiência das pessoas, vem dar conhecimento sobre a nossa realidade aqui. Muitas vezes os governos acham que devem chegar e implantar os projetos, mas realmente eles não conhecem a nossa realidade”, argumentou.

Juntamente com outros comunitários, a agricultora contribuiu com a produção de alimentação coletiva para os participantes do encontro, feita com os próprios alimentos produzidos pelas comunidades apoiadas pelo Fundo Dema. “A gente fez essa mobilização entre os comunitários, e presidentes de associações, para que a gente pudesse contribuir na alimentação”, complementa Rosângela.

Dinamizadores do Fundo Dema falam sobre as consequência do empreendimento 

De acordo com Jurandir, com a possibilidade de se concretizar a construção de hidrelétricas na região, observa-se um aumento no fluxo de carretas, situação que facilmente tem destruído pontes nas estradas, além do aumento da prostituição às margens da BR 163. “Do outro lado deu pra sentir a propaganda que eles fazem desse grande projeto, e eles conseguiram ouvir também o lado dos indígenas, do pessoal que está no Pimental e que sofre no dia-a-dia. Esse momento de debate dos dois lados foi muito intenso e muito importante”, disse.“Dizem que a hidrelétrica não vai atingir nada, mas vai atingir sim. Direita ou indiretamente o agricultor será afetado. Tanto na questão da produção, quanto dos grandes empreendimentos, como o agronegócio que está chegando aqui e de alguma forma vai expulsar os agricultores de suas terras. É muito importante para eles estarem neste debate para compreender a conjuntura que está posta através dos grandes projetos nessa região”, considera Egídio, que integra a equipe de dinamizadores do Fundo Dema.

Outro detalhe que chama a atenção do dinamizador é a liberação de mercúrio no meio ambiente, caso a barragem seja construída, o que pode poluir os rios e prejudicar os povos ribeirinhos. “O mercúrio atinge diretamente a saúde das pessoas. Então que crescimento é esse que vai matar as pessoas que vão comer o peixe do [rio] Tapajós? Mesmo que o peixe escape, ele vai ficar contaminado e se a pessoa comer corre risco de ‘vida’ “, alerta Jurandir.

Denúncias

Durante o seminário, diversas questões foram levantadas tomando como exemplo a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, como a de violação de direitos de povos indígenas e comunidades tradicionais, e ainda o aumento da violência contra a mulher e a exploração sexual contra criança e adolescentes.

 

Prevendo as consequências negativas aos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais o cacique Roseninho Munduruku questiona o desrespeito às legislações que garantem seus direitos. “Quando o Governo invadiu o Brasil, ele matou os indígenas com arma de fogo. Hoje ele mata com um projeto que impacta nossa vida social. A hidrelétrica acaba com a nossa vida cultural. Como a gente vai consumir ar? Como a gente vai se alimentar? Como a gente vai usufruir da floresta se a gente não vai ter mais nada?”, questiona.

 

 

Audiência Pública

Após o término do seminário o MPF convocou uma audiência pública, ocorrida no dia 25, na própria cidade de Itaituba, para debater os impactos das barragens que o Governo Federal pretende construir na Bacia do Tapajós. Na ocasião, a suspensão do licenciamento para a obra, recém determinada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) devido à inviabilidade constitucional, gerou muitos questionamentos ao superintendente do órgão, Hugo Américo.

Em meio à audiência pública, indígenas consultam o protocolo Munduruku

Vale ressaltar que a construção da barragem da usina prevê o alagamento do território indígena Munduruku e o consequente remanejamento deste povo, o que é constitucionalmente proibido. Para os indígenas e ribeirinhos, por ser considerada inconstitucional, a obra deve ser cancelada e não suspensa.

Na luta pelo cumprimento da Constituição brasileira, reforçada pela Convenção 169 da OIT a qual o Brasil é signatário, em garantir os direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais, o povo Munduruku aprovou um protocolo de consulta prévia que diz como quer ser ouvido diante da proposta de construção de hidrelétricas em seu território Sawré Muybu, finalmente reconhecido pela Funai após forte pressão dos movimentos sociais e que será alagado caso a obra se concretize.

Assim como os indígenas, os moradores das comunidades Montanha e Mangabal, localizadas em Santarém, também tiveram motivos para produzir um protocolo de consulta, já que se encontram na rota do empreendimento devastador.

 

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>  Acesse o Protocolo de Consulta Montanha e Mangabal

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