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01/03/2016
Por: Equipe Fundo Dema
Assunto: Notícias
Leitura: 6 minutos

Fundo Dema leva capacitação aos projetos projetos da 3ª Chamada Pública

Por Élida Galvão

Fundo Dema


Depois de terem conquistado a aprovação de seus projetos na 3ª Chamada Pública Geral, lançada em 2014, as associações comunitárias apoiadas pelo Fundo Dema não ficam sem amparo durante o processo de desenvolvimento dos projetos. Para que as associações consigam administrar seus projetos com segurança, é fundamental acompanhar os passos dados do início à conclusão das atividades. Compreendendo a importância em manter as associações informadas, no período de 15 a 23 de fevereiro, a equipe do Fundo Dema percorreu as três regiões de atuação (BR 163, Transamazônica e Baixo Amazonas) para ministrar a ‘Oficina de Capacitação em Monitoramento, Gestão e Prestação de Contas’, realizada por meio da parceria com o Fundo Amazônia.

Matheus Otterloo fala aos representantes de projetos no Baixo Amazonas


Com o objetivo de fortalecer o processo de monitoramento e prestação de contas, além de possibilitar o bom andamento e os desdobramentos positivos dos projetos, a atividade contou com uma programação que aliou teoria e prática para melhor compreensão dos registros financeiros e narrativos das ações realizadas pelas associações. O processo envolveu cerca de 95 participantes, entre lideranças comunitárias, integrantes do Comitê Gestor do Fundo Dema e dinamizadores, pessoas que voluntariamente se disponibilizam em acompanhar o desenvolvimento dos projetos apoiados.

A caravana iniciou na região da Transamazônica. Representantes de 16 projetos estiveram reunidos durante os dias 15, 16 e 17 de fevereiro, em Altamira.  Em seguida, a equipe partiu para Alter do Chão, em Santarém, onde foi realizada a oficina que contemplou os projetos do Baixo Amazonas. Realizada nos dias 18 e 19, a atividade reuniu representantes de 16 projetos. Na semana seguinte, durante os dias 22 e 23 foi a vez dos projetos da BR163 receberem as instruções. Reunidos em Itaituba, representantes de sete projetos puderam esclarecer as dúvidas e somar conhecimentos.

O conteúdo da programação foi igualmente abordado em todas as regiões. Após conhecerem um pouco sobre a história de formação do Fundo Dema, seus princípios e sua atuação, os/as participantes foram orientados sobre a importância de registrar o desenvolvimento dos projetos a partir do Marco Zero, momento inicial do monitoramento. Depois, com o Guia de Prestação de Contas em mãos, receberam informações para a produção de relatórios e administração financeira dos projetos.


Renata Monte orienta os projetosda região da BR163 sobre como executar a prestação de contas

Segundo Francisca Santos de Araújo, moradora da comunidade São Raimundo Nonato, localizada no distrito de Campo Verde, próximo a Itaituba, as informações obtidas na oficina serão compartilhadas com todas as pessoas envolvidas no projeto. “Achei essa oficina muito boa porque muita dúvida que eu tinha foi tirada e quando eu chegar na comunidade, eu vou passar tudinho o que eu aprendi”, disse.

Além do Guia de Prestação de Contas, a equipe do Fundo Dema compartilhou exemplares do Jornal Aldeia, uma publicação da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE) – Programa Amazônia, além de revistas do Fundo, publicada em 2014, em edição comemorativa aos 10 anos de trajetória e calendários de 2016, utilizados também como instrumento político de comunicação em favor da justiça socioambiental.

Mobilização contra os agrotóxicos

Em meio à programação, as pessoas tiveram a oportunidade de debater sobre os riscos que os agrotóxicos causam à saúde e os impactos que provocam no meio ambiente. Após ampliarem seus conhecimentos depois de assistir ao vídeo ‘O Veneno está na mesa’, produzido pela Campanha Permanente de Luta Contra os Agrotóxicos, os/as agricultores, ribeirinhos/as e indígenas que participaram das oficinas firmaram opinião sobre o combate à utilização destas substâncias no campo e na floresta, responsáveis pelo aumento no índice de câncer e outras doenças na sociedade, e saíram em favor da luta contra os agrotóxicos.


Integrantes de projetos apoiados pelo Fundo Dema lutam por uma agricultura que 

assegure a saúde e respeite o meio ambiente

Grande parte dos 41 projetos apoiados na 3ª Chamada Pública Geral do Fundo Dema objetiva desenvolver um trabalho voltado à conservação dos recursos naturais, à implantação de sistemas agroflorestais e manejo de espécies nativas visando garantir tanto a segurança alimentar, por meio do consumo de alimentos livre de agrotóxicos, quanto à saúde do trabalhador do campo e da floresta, de forma a afastar o contato com o veneno e ainda, a preservação do meio ambiente, sem a contaminação do solo, dos lençóis freáticos, do ar e dos próprios alimentos.

Agulhas e linhas como armas para o diálogo

Sandra fala com orgulho sobre arpillera produzida coletivamente

Considerada o principal polo urbano da região do médio Tapajós, Itaituba é uma cidade ladeada pelo Rio Tapajós, uma hidrografia que se tornou um dos principais focos de ganância do capital. Nascido ainda no estado do Mato Grosso, a partir da confluência entre os Rios Jurema e Teles Pires, o Tapajós percorre, na maior parte de sua extensão, dentro do estado do Pará e depois desemboca no Rio Amazonas. Com quase três mil quilômetros de comprimento, esta bacia hidrográfica integra um projeto desenvolvimentista do Governo Federal, que desde 2008 vem avançando no planejamento do ‘Complexo Hidrelétrico Tapajós’, um megaempreendimento que prevê a construção de pelo menos 40 usinas hidrelétricas na região do Tapajós.

Ocorre que a exemplo dos conflitos instaurados em todas as obras desenvolvimentistas já feitas, como aconteceu recentemente com a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, o planejamento sobre o Complexo do Hidrelétrico do Tapajós avança sem a participação das comunidades tradicionais possivelmente impactadas, agricultores/as, extrativistas, ribeirinhos, indígenas e quilombolas. Já são inúmeros os estudos que apontam a devastação florestal, dizimação da fauna, o desaparecimento de comunidades inteiras e os sérios impactos sociais ocasionados, caso as construções de hidrelétricas cheguem a ser concretizadas.

Para alertar sobre esta situação alarmante, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), tem percorrido as localidades inseridas na rota do megaprojeto. No último dia da programação da oficina de capacitação, integrantes do MAB apresentaram aos/às participantes uma exposição chamada Arpilleras¹: Bordando a Resistência, que chegou a ganhar o salão do Memorial da América Latina, em São Paulo. Entre as Arpilleras expostas por lá, cinco foram feitas por mulheres do Pará, entre elas, três da região da BR.

As Arpilleras são bordadas coletivamente. Em grupos, as mulheres expressam as violações de direitos e os sentimentos de abatidos no processo de construção de barragens. Após terem sido exibidas durante o Seminário Direito e Desenvolvimento, promovido pela organização Terra de Direitos, em Santarém, as peças foram expostas aos/às participantes da oficina de capacitação, em Itaituba. Sandra Martins do Projeto Frutos do Baixão, apoiado na 3ª Chamada Pública Geral, ficou surpresa ao saber que a Arpillera que construiu junto com outras companheiras compõe a coleção de peças exibidas no Memorial da América Latina, além de terem sido registradas em um livro produzido pelo MAB. 

Na peça que ajudou a bordar, Sandra alinhavou as contradições de um modelo de desenvolvimento pautado em interesses privados, na exclusão, destruição e desrespeito. Registrou o momento em que a luz chegou em sua comunidade depois de tanta luta coletiva, mas que o que era para ser tratado como um direito conquistado acabou se tornando meio de exploração capitalista.  

 

No verso de cada peça, bolsos internos guardam a história e o significado do bordado

 

“Na época a gente tava feliz que tinha chegado energia lá na comunidade. Era um sonho de muito tempo que a gente tinha conseguido através de luta popular com o fechamento da BR e aí chegou a energia – tudo muito bom, muito bem –, mas como a alegria de pobre dura pouco, pra nossa surpresa quando chega a conta era um absurdo. Eles fizeram de propósito, colocaram a energia rural toda convencional e fizeram o cadastro de todo mundo assim. As contas foram chegando e foram atropelando todo mundo. Quem mora no campo já tem a dificuldade de colocar a comida na mesa porque não tem uma renda fixa. A alegria se tornou numa dificuldade imensa, mas fizemos abaixo-assinado e conseguimos mudar os cadastros para rural, só que não completamente porque até hoje tem gente que persiste”, relatou Sandra.  

 

> Veja fotos da oficina em Altamira (Transamazônica)

> Veja fotos da oficina em Santarém (Baixo Amazonas)

> Veja fotos da oficina em Itaituba (BR 163)

 

¹ Esta é uma técnica de bordado em juta, conhecida como “arpillera” em espanhol, popularizada durante a ditadura de Pinochet (1973-1990), no Chile, como forma de dar voz às mulheres da periferia que bordavam com retalhos de roupas de parentes desaparecidos.