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23/06/2022
Por: Equipe Fundo Dema
Assunto: Geral
Leitura: 5 minutos

Fundo Dema realiza ações de combate à fome, em Abaetetuba

Ação de Solidariedade, que distribuiu 9,6 toneladas de alimentos a famílias de Abaetetuba, antecedeu atividade preparatória ao 10º FOSPA, que discutiu segurança alimentar e nutricional em praça pública.

Por Élida Galvão

Quinhentas famílias de Abaetetuba receberam alimentos, em sua maioria provenientes da agricultura familiar camponesa. Foto: Élida Galvão

Estudante do curso de educação do campo da Universidade Federal do Pará, em Abaetetuba (PA), Maiara Barbosa, 22 anos, se deslocou por duas horas do ramal do Curuperé Grande, comunidade onde mora, até o centro daquele município para receber a cesta de alimentos distribuída durante a Ação de Solidariedade realizada no último dia 31 de maio.

Em relato durante a entrega das cestas, a jovem contou o drama que a sua comunidade vem passando desde que a empresa Minerva, que atua no segmento frigorífico, se instalou em seu território. “A minerva acabou com o Igarapé da minha comunidade. Perdemos tudo, não podemos mais utilizar o igarapé, a gente já não planta mais como antes, porque as grandes empresas chegaram, desmataram, levaram a nossa riqueza”.

Assim como Maiara, muitos jovens de sua turma, ali presentes, compartilham dos mesmos problemas provocados pelas ameaças do agro-hidro-mineronegócio em seus territórios. Na visão dela, não há como dissociar a segurança alimentar e nutricional da luta em defesa do território, porque a invasão destas empresas em diversas comunidades provoca impactos extremamente negativos nos modos das populações tradicionais.

Além dos estudantes da UFPA, também foram contemplados outros grupos sociais, como a Pastoral da Criança da Diocese de Abaetetuba, a Cáritas Rainha da Paz, e o Coletivo Amazônico Lesbitrans de Abaetetuba. Ao todo foram doadas 9,650 toneladas de alimentos, com a distribuição de 500 cestas contendo entre outros alimentos, banana, laranja, farinha de mandioca, goma, jerimum, beiju, ovo caipira, frango caipirão, produzidos pela agricultura familiar camponesa.

A ação foi articulada junto com a realização do seminário que discutiu a defesa do território e a segurança alimentar e nutricional. Foto: Élida Galvão

Os produtos agroecológicos entregues às famílias foram fornecidos pela Associação de Mulheres Quilombolas Agroextrativistas Raízes do Bacuri, Associação Mutirão de Igarapé Miri, Associação das Mulheres do Campo e Cidade de Barcarena e Cooperativa de Extração e de Desenvolvimento Agrícola de Barcarena (CEDAB).

Antônio Ronildo Nascimento era uma das pessoas orgulhosas em contribuir na Ação de Solidariedade, tendo transportado alimentos da CEDAB para a composição das cestas, o trabalhador disse estar feliz em fazer parte deste processo. “Hoje eu trouxe os frangos e estou muito feliz em contribuir com esta ação de solidariedade que trouxe comida para quem tem fome, porque a fome quer resultado e esse resultado é o alimento. Estou feliz em estar ao lado de organizações que lutam pela dignidade da pessoas humana e espero participar da ação que vai ocorrer em Barcarena também”.

De acordo com a coordenadora do Coletivo Lesbitrans, Gabi Anjos, a ação ajudou 15 famílias de pessoas LGBTQIA+ e negras em situação de vulnerabilidade socioeconômica. “É muito importante essa ação para o combate à fome. Nossa gratidão se estende ao Fundo Dema e aos parceiros de território que lutam por igualdade social, por terra, justiça a humanização das pessoas”, considerou.

A Ação de Solidariedade realizada em Abaetetuba pela Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE) e o Fundo Dema, com o apoio de Open Society e a parceria de diversas organizações locais, antecedeu o Seminário preparatório ao 10º Fórum Social Pan Amazônico, ocorrido no dia seguinte, em plena praça pública de Abaetetuba.

Seminário Pré-FOSPA

“Precisamos tirar esse pensamento de que vida melhor é na cidade, a vida boa é no nosso território. Nosso território simboliza a vida. Nós somos o nosso território e ele tem valor e não preço”, destacou o universitário Vanilson Cavaleiro, da comunidade Bom Remédio, localizada no território do Baixo Tocantins, durante o Seminário sobre Segurança Alimentar e Nutricional: Embarca na Luta, embarca! Defender os territórios por comida de verdade nas florestas e nas cidades, realizado no dia 1º de junho, no município de Abaetetuba (PA).

O encontro reuniu cerca de 350 pessoas na praça Conceição, que fica no centro de Abaetetuba. Diversas caravanas traziam ribeirinhos/as, agroextrativistas, quilombolas, agricultores/as familiares de comunidades tradicionais localizadas no entorno daquele município e que se juntaram às/aos moradoras/es da cidade.

Mais de 300 pessoas participaram de seminário realizado em praça pública. Foto: Élida Galvão

Entre as pessoas convidadas estiveram Maria Emília Pacheco, representante do Grupo Nacional de Assessoria da FASE, Teófila Nunes, trabalhadora rural da agroecologia e da Direção Estadual do MST e Daniela Araújo, representante da Associação dos Agroextrativistas, Pescadores e Artesãos do Pirocaba (ASAPAP).

Interagindo aos questionamentos colocados pelos participantes, Maria Emília salientou a importância de fortalecer políticas públicas como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). “As poucas iniciativas que vão sendo tomadas em favor da agricultura familiar e dos agroextrativistas acabam não durando na história. A luta para que volte o PAA precisa continuar, por mais burocrático que seja, porque não há burocracia para o agronegócio, que é privilegiado o tempo todo. Nós não podemos concordar que o governo continue isentando em 6 bilhões de reais a venda de veneno. Quem produz refrigerante que estão causando problema na alimentação, continua se beneficiando. E onde ficam os sucos produzidos com frutos nativos da Amazônia?”, questiona.

Ainda de acordo com Maria Emília, existe uma questão importante, que é a conquista da isenção de protocolos sanitários para a alimentação escolar em territórios indígenas, quilombolas e de populações tradicionais. “O Ministério Público, a partir do estado do Amazonas, fez uma nota dizendo que os alimentos produzidos pelas comunidades tradicionais e pelos povos indígenas não têm que passar pela fiscalização da Agência de Vigilância Sanitária (ANVISA), eles têm que chegar direto nas escolas”.  

A atividade contou com a participação de Maria Emília Pacheco, Teófila Nunes e Daniela Araújo. Fotos: Élida Galvão

Pacheco faz referência à Mesa Permanente de Diálogo Catrapovos Brasil, instituída pela Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal (6CCR) em 2021, uma iniciativa ampliada a todo o Brasil a partir da Comissão de Alimentos Tradicionais dos Povos no Amazonas (Catrapoa), que possibilitou a edição de notas técnicas que dispensam exigências sanitárias e permite a compra direta dos alimentos tradicionais pelo poder público para o autoconsumo ou consumo familiar nos territórios tradicionais, beneficiando, assim, a alimentação de crianças e adolescentes do ensino básico.

Questionando o projeto de morte do capitalismo e o retorno do país ao mapa da Fome, Dona Téo, como é conhecida Teófila Nunes, diz que é necessário lutar de forma unida para conquistar a soberania alimentar e uma alimentação saudável. “Eu lembro a fala da terra que isso não é só assunto de lavradores, mas é do campo e da cidade. Somos nós que temos que apressar esse trabalho para mudar a sociedade. As pessoas estão morrendo de fome e de câncer, proveniente de uma alimentação que não é adequada, mas é uma comida envenenada”.

No diálogo com a população, Daniela Araújo argumentou que a segurança alimentar e nutricional não pode estar desvinculada da defesa do território. “A minha bandeira de luta é a defesa do meu território, porque o nosso território não é mercadoria. E para defender o nosso território, a segurança alimentar, é preciso a gente defender nosso alimento”.

O encontro foi realizado pela parceria pela FASE e Fundo Dema, com o apoio de Latindadd, em preparação ao 10º Fórum Social Pan-Amazônico, que vai ocorrer ao fim de julho, em Belém (PA), reunindo representantes dos movimentos sociais e da sociedade civil dos nove países que integram Pan Amazônia.